segunda-feira, março 26, 2007

E o grande vencedor foi... Salazar

É curioso que num país com 868 anos de história (faço as contas desde 1139, ano em que, após a Batalha de Ourique um dos “concorrentes” decide auto-proclamar-se Rei), quatro dos finalistas e os três dos vencedores sejam da primeira metade do século XX.
Foi Salazar importante? Para bem e para mal foi. Foi um ditador, o regime era fascista, a opinião política era perseguida. Também foi ele que sanou as contas públicas, electrificou a maior parte do país, fez várias infra-estruturas necessárias e manteve-nos fora da II Guerra Mundial. Não foi o Diabo na Terra. Dai a ser o maior português de sempre... vai uma grande distância.
Álvaro Cunhal também não merece o lugar que teve. Opositor do regime de Salazar, é verdade, tinha um objectivo em mente: substituir um regime ditatorial de direita por um regime ditatorial de esquerda. A memória é curta, e já todos se esqueceram das inúmeras tentativas de golpes, que culminam no 25 de Novembro. Também é curta, a memória, ao esquecer que o Dr. Cunhal foi o único líder comunista do “ocidente” que aprovou a invasão de Praga pelos tanques soviéticos, para por fim à “revolta democrática”.
Em tão ilustre companhia, é curioso ver a decisão do povo português. O nosso primeiro rei, D. Afonso Henriques, tem o mérito de, contra Castela, os nobres galegos e a própria mãe, concretizar o sonho do seu pai: um reino independente, que ainda hoje subsiste, um dos mais antigos da Europa, é preciso relembrar.
Mas em quase 900 anos de Portugal, por dois períodos fomos um exemplo para toda a Europa. Pela mão de Sebastião José de Carvalho e Mello, vulgo Marquês de Pombal, Portugal investiu em educação e tecnologia, reconstruiu a sua capital depois de um dos piores terramotos da história. Marquês de Pombal volta a colocar Portugal no mapa europeu.
Mas para mim, o maior português de sempre é sem dúvida alguma D. João II. Nenhum rei em Portugal tem um legado tão importante, e ainda lembrado, como este: 150 anos de domínio quase absoluto dos mares. É ele, enquanto ainda príncipe, que convence o pai, Afonso IV, o africano, a ir à conquista de África. É ele quem desenha as linhas mestras da estratégia dos descobrimentos portugueses. O seu irmão, o Infante D. Henrique, tem o mérito de concretizar o sonho do Rei, mas quem toma a decisão e estabelece o objectivo é D. João II. É ele que divide o mundo com os espanhois, que tentaram inclusivé pressionar o jovem rei português por intermédio do Papa, e fica com a melhor parte: África e Brasil. Graças à sua estratégia, brilhantemente concretizada pelo seu irmão, Portugal assume pela primeira vez o estatuto de super-potência. É a nação tecnologicamente mais avançada (a vela latina, as caravelas que podia navegar em alto mar, o nónio, a navegação pelas estrelas eram o equivalente aos computadores, satélites e vaivéns da NASA de hoje), comercialmente mais rica, e com o domínio dos mares. Lembrem-se que na divisão do mundo, os portugueses pagavam para atravessar o mar espanhol e vice-versa. Curiosamente Portugal não tinha disso necessidade (as rotas comerciais passavam pelo Atlântico, nosso), ao contrário de Espanha que pagava o tributo por atravessar as “águas territoriais” portuguesas.
O português é saudosista. Temos saudades do velho império. Somos um dos poucos povos do mundo que tem este estranho conceito de “saudade”. Talvez por isso Salazar tenha ganho: o que D. João II constrói é erguido ao conceito de valor máximo de Portugal por Salazar: Portugal projecta-se no mundo como o primeiro império intercontinental, apoiado na sua história e na unidade, de Trás-os-Montes a Timor. Como dizia Fernando Pessoa, outro dos ilustres finalistas, “Senhor, falta cumprir-se Portugal”.